Está inscrito na Constituição da República portuguesa que qualquer cidadão por ela representado tem direito ao trabalho, mas ter direito ao trabalho não é o mesmo que ter direito ao salário.
Se a Constituição não estabelece esse vínculo ao salário e é a lei primeira do nosso Estado, como entender que na cabeça da maior parte de nós, o salário seja indissociável do trabalho? Para a maior parte, não ter salário implica não ter de se trabalhar de todo.
Embora a palavra desemprego remeta para a falta de emprego (o que em si mesmo não é igual a falta de trabalho), o drama do desemprego joga-se sobretudo na falta de um salário para arcar com os custos da vida. Quase ninguém fala do desemprego à luz da falta de trabalho. E sabem porquê? Porque não há falta de trabalho, há sempre que fazer um pouco por todo lado.
No plano mental, só temos a ganhar com o quebrar a ideia de que precisamos de um salário para trabalhar. Trabalhar é um direito, pelo que nada impede que alguém que queira muito fazê-lo, o possa em verdade fazer. Além do mais, o trabalho liberta (os nazis deturparam o sentido ao colocá-la na entrada dos campos de concentração).
Se separarmos a ideia de que precisamos de um contrato no qual se combine um salário, da ideia de que só precisamos de nós mesmos para efectivamente começar a trabalhar, talvez comecemos a trabalhar gratuitamente e a receber o que tivermos a receber como prémio/recompensa material, não como um direito.
Afinal, há pessoas que hoje recebem dinheiro para cuidar de uma criança e, em simultâneo, há avós e pais que continuam a fazê-lo sem receber nenhuma contrapartida material em troca. Não têm ambos o mesmo trabalho? Certamente, que sim, mas os salários são distintos. Ter um salário não é tudo.
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