Imagem: Lua with egg II - Homage to Brancusi - Mario Cravo Neto (1992)
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Há bastante riqueza medidativa no clássico Amor de Perdição. Partilho algumas breves reflexões pessoais:
- No passado, como no presente, vários motivos concorrem para o mau desfecho de uma relação amorosa. Hoje não serão tanto as famílias a proibir alguém de amar, mas no passado podiam ser, nomeadamente o ascendente patriarcal sobre o destino e paradeiro das filhas. Em todo o caso, a história prodigaliza o fracasso da força para impedir ou garantir o sucesso de uma relação amorosa.
- Nisto do amor entre duas pessoas, há amores fáceis e amores difíceis. No tempo de Camilo, como no tempo de hoje, a obsessão e a teimosia propõem-se ser forças a favor do vigor e fulgor de um sentimento, mas só estorvam. Na cabeça de Simão Botelho, que era um ser viril, o amor difícil é um amor mais valioso de ser vivido do que o amor fácil, entendendo por fácil um amor mais provável e acessível de concretizar. Porque motivo a incursão em sofrimento (intrínseca ao amor difícil) haveria de proporcionar um maior desfrute de uma relação amorosa?
- A obre permite também questionar o impacto que um beijo fácil ou um beijo difícil, ou seja, a maior ou menos dificuldade em chegar a vias de fato alimenta, perturba ou assiste a intensidade amor. Hoje vivemos no contexto do beijo fácil, e com isso arrepiamos caminho para a objetividade do amor. Em outros tempos, a privação do contacto físico incendiava os espíritos e promovia a valentia. Porém, a história mostra que essa mesma valentia adulterou o que era suposto ser puro e real, turvando mental e emocionalmente o sentimento.
Assim, mais do que uma icónica demonstração de amor, Amor de Perdição parece-me um livro que nos permite pensar em que medida mais não acaba por ser menos, e em que medida não somos nós os principais responsáveis pelo que nos acontece individualmente na vida (amorosa).
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