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Sobre o uso indiscriminado de certas palavras

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Há alguns meses que vivo com uma sensibilidade inédita para os perigos do uso de palavras que invocam a perpetuidade do tempo e das coisas.

Por isso, ultimamente, quando escuto expressões como sempre, nunca, para sempre ou foi sempre assim, sou beliscado pelo desconforto que essas expressões me provocam, devido à natureza predominantemente falsa com que são usadas. Que sabemos nós do passado e do futuro para garantir que algo tenha sido sempre de um modo ou que passe a ser desse modo a partir de hoje? Acho que nem damos conta da quantidade de vezes que recorremos a estes aglomeradores de temporalidade e os usamos sem respeitar o seu significado, um significado tão intangível às escalas em que o cérebro processa, que o sempre ou nunca, podem perfeitamente simbolizar semanas ou meses, o que torna patético o recurso a tais palavras.

Mas se o recurso a termos que dependem da noção de tempo e temporalidade não está a ser brilhante no seio do que é o nosso hábito natural de as usar, o que dizer de palavras como tudo e nada, todos, ninguém. Estas aqui são a priori mais inteligíveis, visto englobarem o universo material, tema bem mais fácil de abordar que o do tempo. Contudo, quantas vezes se diz que correu tudo bem, nada ficará igual ao que era, ninguém gostou, com tamanha naturalidade que até acreditamos que de facto assim é.

Qualquer professor de português poderia rematar o assunto como afirmando tratarem-se de utilizações da hipérbole, enquanto recurso de estilo que é: exageros da realidade.

Não me compete proibir ou limitar o uso destas expressões, cuja força é comprovada pela naturalidade com que são usadas, mas confesso que este surto de sensibilidade sobre o seu uso aflige-me a ponto de ficar a pensar na legitimidade do seu uso na maior parte das vezes em que me apercebo da sua aplicação. No fundo, compete-me mais perguntar, por exemplo, se na raiz da utilização destes termos, não poderá residir a maior ou menor tendência para o radicalismo das observações.

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