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Sobre Sócrates em 'A República', e a poluição moral que fere de morte o futuro de uma sociedade

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Imagem: Crowd on the bus stop - Kuzmafoto



No terceiro capítulo do livro A República (de Platão), o leitor é surpreendido com uma severa crítica que Sócrates faz à falta qualidade de múltiplos versos de Homero, Ésquilo, e outros artistas. Para Sócrates, as passagens em causa mereciam ser suprimidas por afastarem inaceitavelmente os cidadãos da construção de um modelo individual e colectivo assente no florescimento das virtudes e na salvaguarda da temperança. Tal situação, por não ser do interesse colectivo, é nociva para o bom desenvolvimento da sociedade, em particular das novas gerações que crescem com esse padrão cultural e que vêm a seu tempo a tomar por natural.

Temos também hoje na nossa sociedade quem, como Platão, seja sensível a esta questão, e procure descarnar nas várias fontes de entretenimento e informação, os modelos e o sentido dos estímulos que são dados ao cidadão. Muitos dos 'Sócrates' de hoje acabam comprando guerras e chatices por terem um critério de qualidade distinto daquele que faz escola entre os demais. É que hoje, a hegemonia do prazer é total: o prazer vale por si, e o prazer de consumir é o critério mor da sociedade. Molda-a a servir de bandeja o que dá prazer, qual alimento ao apetite do faminto de entretenimento.

Creio que no tempo de Sócrates o termo ecologia ainda não tivesse sido cunhado. Hoje, e infelizmente, somos capazes de sair à rua em nome da poluição ambiental, por muito aquecer os ares e derreter os gelos, mas somos uns tremendos cegos, surdos e mudos para a poluição moral (falta de virtude e temperança) que grassa na forma de filmes, novelas, reality shows, desporto, política, literatura, música, jornalismo, economia, justiça. Com tempo, o cidadão nivelar-se-á (já o fez) por padrões tão maus, e torna-se-á fraco (já o fez), sem carácter. Neste caldo, o bom desenvolvimento da sociedade, como Sócrates bem sabia e deixou plasmado n'A República, é dramaticamente posto em causa. 

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