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Sobre a abstenção crescente em Portugal, e a (in)disponibilidade para nos comprometermos publicamente com temas coletivos e transversais

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Narcissus - Ghazi Baker (2017)

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Em véspera de novas eleições, adensa-se o risco de mais uma vez o número de pessoas que não faz valer o seu poder de voto ser uma ordem de grandeza comparável à dos cidadãos que participa no ato eleitoral pela vertente da tomada de decisão. Na primeira eleição democrática menos 10% não quis votar, e desde então esse valor tem vindo a subir, cifrando-se em 44.1 % em 2015. Isto em matéria de legislativas. Impõe-se perguntar: porque não votam as pessoas? 

Responder a esta questão é um ato de fé. Há quem diga que é da qualidade dos partidos com assento parlamentar, mas nunca como agora houve tantas opções políticas. Há quem diga que é desinteresse pelo sistema político como um todo, e aí, por ser uma resposta subjetiva e estéril, é mais fácil de concordar. Há quem diga que é porque o processo eleitoral ainda é demasiado material e presencial, e as pessoas se  aborrecem de ter ir a uma junta de freguesia ou escola pública para exercer o seu direito de voto. Poderá ser, mas será que é só isso?

Quero acreditar que o problema da participação na política é que as pessoas têm (alguma) dificuldade em comprometerem-se com o quer que seja por mero exercício de cidadania, a ponto de fugirem sempre que possível das suas responsabilidades de cidadão, cliente, usuário ou outras. Queremos cada vez mais poder circular, comprar, consumir, viver sem ser incomodados, sem a maçada de nos comprometermos publicamente com o que quer que seja. Julgo ser aqui que mora o problema da abstenção: a disponibilidade para nos comprometermos publicamente com temas coletivos e transversais é residual. Alguém que trate deles por nós, como que por procuração tácita. A outra metade do país que vota.

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