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Contactei recentemente com um jogo de cartas onde, sob as mesmas regras, a estrutura de premiação para combinações de 5 cartas (com direito a uma substituição por cada carta inicialmente recebida) se vai alterando com o tempo. O jogo é essencialmente o mesmo mas o sucesso ao jogá-lo depende não só da sorte no sorteio das cartas (e aqui o aleatório é soberano) mas também da estratégia seguida para as combinações face à mutável estrutura de premiação. É que há combinações mais fáceis de obter mas que premeiam menos, e outras menos prováveis de acontecer mas passíveis de catapultar o desempenho para patamares mais elevados.
Para além da curiosidade do e jogar o jogo , está o ensinamento que me induziu a pensar. Conhecemos os preceitos sobre arriscar e petiscar, sobre a proteção dos audazes pela sorte ou, em sentido contrário, a máxima do pássaro na mão e dos dois a voar. O extraordinário da experiência nas cartas é que as emoções triangulam entre um parecer não sair da cepa torta quando; entre um estar a jogar para perder mais e mais; e o êxtase de conseguir por fim chegar a uma combinação rara que faz brotar um grande lucro da experiência desmotivante de sucessivos sorteios inglórios. Acresce ainda que a triangulação emocional é distinta quando o grande ganho acontece logo no início e se fica com margem para gerir os rendimentos, ou quando só surge no limiar final impaciência com o infortúnio dos sorteios de cartas.
O que retiro deste passatempo é que também na vida as coisas podem encaixar nesta dinâmica. Os princípios, ambições e necessidades impelem-nos a jogar com determinada estratégia, e cabe a cada sistema (com suas regras) premiar ou não aquela estratégia, paciência e esforço. É uma questão de ter critério quer na adoção estratégia de prémio (lucro imediato ou a prazo) quer na seleção do sistema de regras sob o qual insistir (onde, quando, em quê). Nem tudo é sorte e azar, mas não há vitória ou derrota sem sorte ou azar.

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