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Sobre a instrumentalização do Mundial do Catar 2022 para criar um boicote do mundo a si mesmo em problemas que não são novos nem acabarão em 90 minutos de futebol

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Lax Goal - Adam Eddy (2018)

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Há coisas que, se frias e desnudadas pendem para um sentido, se quentes e adornadas pendem para outro. É o caso do mundial do Catar que tanta areia está a fazer a correr. Uma adjudicação económica e politicamente corrupta, uma megalomania de investimento, um conflito com leis islâmicas, numa prova de seleções na modalidade rainha que a todos apaixona.

Há várias formas de abordar o conflito de circunstâncias congregado pelo mundial do Catar. Virtualmente qualquer pessoa tem algo a atacar. Só de um catari tradicionalista apaixonado por futebol se esperaria pouco ou nenhuma crítica, e mesmo aí a densidade súbita de turistas de estilos comportamentais tão diferentes num território tão exíguo certamente suscita atritos. De resto, não é preciso grande aceleração personalística ou intelectual para condenar e criticar o conteúdo e a forma como um país marginal no universo futebolístico consegue chamar a si uma prova muito maior do que o seu prestígio como nação, do que seu interesse como território, do que a sua cultura no geral, e do que o seu futebol em particular.

O esforço que o Mundial requer é outro, é o da moderação. Não é por ter havido corrupção, por a prova ser organizada num país de fundamentalismo religioso, e num local onde a democracia e os direitos humanos estão aquém, que o mundo se deve boicotar a si mesmo. Afinal, a prova é entre nações, e tem um anfitrião que se portou mal. O convívio não é com o anfitrião, é apesar do anfitrião. As frentes que nos afastam do anfitrião já existiam muito antes da prova, continuam a existir durante a prova, e não sabemos quando deixarão de o fazer. Por isso, deixemos o Mundial do Catar em paz, porque ele não deve ser bode expiatório nem instrumentalizado para problemas que são de envergadura histórica e temática que em muito extravasam o tempo e motivo pelo qual trinta e duas seleções se tentam superar por um troféu desportivo no espaço de um mês.

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