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Sobre os desencontros mentais com o presente, passado ou futuro, nas pessoas que encontramos um pouco por todo lado

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Past future - Adam Martinakis (2020)

Não deve haver uma pessoa no mundo que não seja atormentada, em algum assunto da sua envolvência, pela convicção de que as coisas deveriam ser diferentes daquilo que mostram ser. Há quem explore este desconforto para com o status quo para produzir as necessárias inovações. Mas também há quem sucumba e se derrote interiormente pela frustração de não ver materialziada essa versão diferente que defende.

A cada novo dia que vivemos cruzamo-nos inadvertidamente com pessoas a lutar pelo passado, a lutar pelo presente ou a lutar pelo futuro. Há também pessoas a sofrer pelo seu passado, pelo seu presente ou pelo futuro. A máxima budista de que todo o homem sente dor encaixa bem nesta descrição, mas o que me apraz frisar é que há danos colaterais da distração que estas diferentes dinâmicas criam. Desde logo o peso que novos factos ou passagens assumem perante o cenário mental que está a ser vivido.

Quem põe o tónico mental no passado e se frustra com o que por lá se passou, tenderá a achar que o mal já está feito e que nada o suplantará. Esta atitude foi também a de séculos de humanidade  - como muito bem explicou Yuval Harari no seu livro Sapiens - quando vivia para expiar o pecado original, e quando via tudo daí para a frente como a degradação progressiva do mundo (face ao inexorável pecado original).

Quem põe o tónico mental no presente vive atormentado pela carga do real, pelos instantes irrepetíveis do que lhe coube de bom viver, ou pelos instantes que se eternizam do que lhe coube de mau viver. O presente tanto pode parecer passar a voar se à mente houver convição de que as coisas não deveriam mudar, como pode parecer progredir a passo de caracol quando o ímpeto reformista ou uma batalha decisiva se espera vislumbrar no horizonte.

Quem põe o tónico mental no futuro desconsidera a torto e a direito o que há. Vive em rejeição do passado e presente porque esses não saciam. E com isso sofre amordaçado pelo tardar tanto em chegar ao ponto onde as coisas não pareçam tão do passado como hoje parecem. Pode ser um visionário, mas pode também ser alguém que desperdiça o tempo certo pelo tempo incerto.

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