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Sobre a facilidade em desistir*

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* Ivo Pais escreveu um texto na qualidade de Amigo do 3vial e é o quarto participante desta iniciativa:

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Cada vez se torna mais simples deixar de parte algo que não nos agrada, qualquer que seja o motivo deste descontentamento. O extremo facilitismo em gerar estas opiniões, em assumir estas decisões faz com que a negação seja algo fútil, despreocupado e demasiadamente regular.

Por haver assuntos que merecem mais a nossa atenção, os mesmos não devem ser acatados levianamente sem serem tratados com o devido cuidado. Mas hoje em dia, a posição que se toma é a de ‘deixar andar’ e ‘ver aonde leva a situação’, o que implica que os assuntos não sejam tratados com a importância que merecem. Isto é: quando algo é muito importante, não se ‘deixa andar’ o assunto e cuida-se dele atentamente; mas se essa questão nem sequer faz sentido, então é natural que se descarte a mesma sem delongas e sem condições.

A maneira mais simples de resolver as situações é realmente desistir quando algo se torna chato ou cansativo ou até quando existe acomodação. Mas além de ser o modo mais simples, é também o menos custoso e o que envolve menos racionalismo. Sendo nós seres pensantes, seria natural que a nossa tendência fosse aproveitar essas situações para melhorar e incrementar o nosso pensamento, as nossas vivências. Mas o que acontece é que os momentos difíceis não aparecem para melhorar a nossa demanda como seres racionais, mas sim para desculpar algo que se deseja e que não se tem coragem de assumir. A desistência é uma forma de sabedoria. A desistência no momento certo vale mais do que a continuação em qualquer altura. Desistir na altura apropriada traz-nos menos prejuízos do que querer sempre ver o que vai acontecer e deixar chegar até ao último instante para tomar a mesma decisão que, saberíamos à partida, seria aquela que iríamos tomar.

É certo que esta clarificação sobre a melhor altura para desistir não vem incorporada em nós à nascença, mas ganha-se, como qualquer outra característica que temos. Por isso, é natural que mais tarde ou mais cedo saibamos como ter este controlo. Desistir pode parecer um acto pouco egoísta, mas no final, a conclusão é que saber quando parar será sempre melhor para nós do que para os outros. O que não quer dizer que não se pense quando se trata do nosso bem-estar. Implica, sim, que teremos de saber conciliar o nosso bem-estar com o dos outros.

2 comentários:

  1. Caro Ivo,

    As atitudes do 'deixar andar’ ou a de ‘ver aonde leva a situação’ constituem traços porventura indeléveis daquilo que é o estado da nossa sociedade.

    Embora, como dizes, sejamos seres pensantes, a grande verdade é que isso não é usado para que nos achemos no dever de intervir e de nos atravessarmos verdadeiramente sobre as coisas, nos objectivos, na vida.

    A educação dada por muitos pais espelha isso mesmo: verifica-se a (total) desistência de tentar moldar o intelecto e perfil dos filhos, enquanto jovens, acção que custa tempo, energia e dinheiro, (porque não), e que tem como consequências a formação de adultos impreparados para educar novas gerações, as quais por arrasto serão igualmente inadequadas para educar as subsequentes gerações.

    Por outro lado, a desistência em votar, por exemplo, pode constituir o produto da lamentável percepção de que não há alternativas verdadeiramente originais e revolucionárias para um país. José Saramago explora esta ideia no seu Ensaio sobre a Lucidez.

    Um forte abraço,

    Marcelo Melo

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  2. Parabéns aos dois pois maravilhosas palavras bem ajustadas dando enfase a questão...

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