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Sobre a poligamia e as relações actuais

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A entrada no novo ano lançou-me na perseguição da explicação para a forma como as pessoas actualmente se relacionam amorosamente umas com as outras, e quase estupefacto fiquei quando me apercebi de que existe uma via argumentativa que se me afigura agora plausível mas que é inédita nas minhas investidas sobre o tema.

Tomando em consideração a existência de uma tendência para múltiplas relações curtas, entendendo por curtas um espaço temporal que não transcenda um lustro de anos, pergunto-me se esta não é senão uma via esteticamente encapotada de se instituir informalmente uma variante moderna da poligamia.

Cheguei a esta ideia porque me dei conta de que é errado falar-se numa incapacidade actual para aguentar as relações. Abordar a questão nesta perspectiva certamente invoca os factores culturais da sociedade, a evolução dos valores, os ritmos de vida moderna, mas retira de cena o papel activo dos intervenientes das relações, com particular ênfase naquilo que será a vontade de cada um deles.

O meu acidental esbarrar no conceito de “variante moderna de poligamia” resulta do crescente acreditar na existência de uma vontade generalizada de poupar paciência e energia com alguém que começa a conflituar ou gerar atritos connosco, ou que pura e simplesmente deixa de nos arrebatar hormonalmente falando.

Assim, ao invés de se andar na senda da extraconjugalidade, prática que imperou clandestinamente durante séculos – arrisco dizer - porventura como a forma de concretização do desejo de poligamia, os dias de hoje são outros e uma nova prática está na moda. Considerando o assunto nesta perspectiva, a qual certamente está condicionada a um lado da moeda apenas, talvez o crescente número de divórcios possa em alguns casos representar o reconhecimento de que o modelo antigo de casamento e extraconjugalidade não mais granjeia adeptos. Para esses, nada melhor do que não trair um cônjuge para satisfazer a sede de poligamia, antes ir traindo à vez, vez após outra.

6 comentários:

  1. Evolução dos valores? Retrocesso, diria eu, meu caro Marcelo Melo. Você, jovem inteligente como é, sabe ler muito bem o seu tempo. E pelo que posso, através destas breves palavras, conhecer de si, parece-me ser um jovem que dá valor aos valores. Mas não sei o que lhe diga caro amigo, pode correr o risco de vir a ser marginalizado. A sua sorte (a sorte dos meus filhos que têm mais ou menos a sua idade)é a de que ainda vai existindo uma pequena percentagem de jovens como vocês, que dará para terem a possibilidade de criar laços fortes e ...honestos.
    É claro que a poligamia floresce em Portugal. Pior- já ouviu falar numa corrente social chamada swing? Os casais trocam-se em clubes privados e ali mesmo etc...
    Isto está uma choldra!
    Com amizade.

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  2. Caro Marcelo e caro Poeta do Penedo,
    Concordo com as vossas opiniões sobre a actual situação das relações. De facto é arrepiante ver a maneira como as pessoas tratam as suas relações e como prescindem dos principais valores que a sociedade deveria ter (a meu ver, claro).
    Mas também acredito que isto se deve às pessoas não conseguirem agir no que se designa normalmente de 'meio-termo'. Se é verdade que agora "isto está tudo uma choldra" (como diz o caro Poeta do Penedo), também é verdade que antigamente só não estava, porque as pessoas não tinham oportunidade de lutar pelo que sentiam. Quantos casamentos infelizes aconteceram e ainda acontecem, em que as pessoas não sendo felizes não o declaram, porque prometeram tudo e mais alguma coisa quando não sabiam como ia ser o seu futuro.
    Não quero que pensem que sou a favor desta 'rebaldaria' que acontece hoje em dia, mas também não posso ser a favor de casamentos infelizes. O que acontece é que, infelizmente, as pessoas de hoje em dia não têm nem querem ter, adiantava eu, paciência para lidar com os problemas que lhes aparecem à frente.
    Como disseram: a sorte é que ainda vão existindo pessoas que querem lutar pela sua dignidade e pelos valores mais essenciais.
    Os melhores cumprimentos,
    Ivo Pais

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  3. O meu caro Ivo Pais tem toda a razão quando diz que as pessoas t~em o direito à felicidade. Mas a questão que o nosso jovem e caro amigo Marcelo Melo levantou relaciona-se com a imoralidade. Não é imoral um casal terminar um casamento quando chegam à conclusão que nada mais têm a haver um com o outro. Sempre aconteceu e continua a acontecer, muito embora hoje em dia o amor definhe muito mais facilmente do que acontecia antigamente. Mas isso não significa que «isto» se tenha transformado numa choldra, num regabofe animalesco, vazio de qualquer sentimento humano. O que se colocou em questão foi a poligamia. Hoje em dia, desde que o sexo começou a ser comentado sem qualquer pudor, nos orgãos de comunicação, eles e elas transformaram o meio social numa autêntica selva sexual. Os machos observam o meio que os rodeia, de nariz no ar, procurando o odor do cio das fêmeas, e as fêmeas, despidas de qualquer feminilidade, transformaram-se em verdadeiras fêmeas, permanentemente no cio. No entanto, coisa espectacular, com tanta actividade reprodutora em aceleração máxima, a natalidade decresce de forma extremamente preocupante. Eles e elas, com os seus respectivos cônjugues, em múltiplos e múltiplos casos, casam incessantemente, fora do casamento. Ainda há poucos dias, surgiram num jornal fotografias de uma senhora figura pública, que se diz muito senhora, muito intelectual, que retratavam as suas expressões faciais no momento em que em orgasmos.
    O termo «decência» está a ser abolido do nosso vocabulário.

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  4. Caros Poeta e Ivo Pais,

    Desde 2006, altura em que iniciei este espaço, devo confessar que poucos foram os textos que conseguirem arrancar dos leitores comentários estruturados, muito menos discussão.

    Fico extremamente feliz por verificar que finalmente um texto meu despoleta discussão formal por escrito entre leitores.

    Eu tento escrever sobre matérias que me despertam o interesse e que julgo ser do interesse de outras pessoas. Porém, a maior parte do percurso neste blogue tem sido de certo modo solitário, porque os leitores preferem guardar para si as suas reacções aos textos, ou então comentá-los comigo pessoalmente ou por outras vias.

    Registar a discussão nos comentários é para mim notável, pelo que só posso desejar que surjam mais ocasiões como esta.

    Marcelo Melo

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  5. Caros Poeta e Ivo Pais,

    Permitam-me que comente o que ambos disseram. No meu entender, não há dúvidas de que o homem e a mulher têm o direito, ou mesmo o dever, de terminar uma relação quando esta perde a sua essência vinculativa. Porém, o que é verdadeiramente perturbante é constatar que hoje em dia floresce cada vez mais uma incapacidade para se terem relações sólidas. A regra geral já não são relações duradouras, antes remendos de relações que se vão acumulando ora para tapar os remendos anteriores ora para satisfazer qualquer vontade imediata e porventura menor.

    Está a fazer falta planificar a vida e saber eleger os valores e acontecimentos que são verdadeiramente importantes para os planos, projectos de cada pessoa.

    O ideal de família está a transformar-se num farrapo.

    E para terminar, esta matéria só merece ser discutida porque as pessoas não estão mais felizes do que já foram, não estão a conseguir ter vidas melhores do que as dos pais ou avós, pelo menos em termos de relações e satisfação das expectativas.

    Marcelo Melo

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  6. Caro Marcelo Melo
    Se os seus textos não têm tido as reacções que, aos escrevê-los, supôs virem a ter, não é, de todo, da sua responsabilidade, pois apresenta-nos temas extremamente interessantes, e apresentados de forma literariamente ricas.
    As suas conclusões neste seu comentário são perfeitas, o que considero extraordinário num jovem da sua idade. Efectivamente os amantes de um hoje não conhecem a riqueza que existe num beijo, porque os beijos de hoje perderam subtileza. E pensava eu nos meus anos 70, quando tive a sua idade, que vivia tempos em que estávamos a superar tudo o que era minimamente aceitável, moralmente falando.
    Com amizade

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