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Sobre um exame muito singular

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Na sexta-feira passada, da parte da manhã, fui sujeito a uma inesperada prova de carácter, concretizada na forma de um exame universitário cuja supervisão por parte do docente foi subtraída ao acto da examinação.

Admitindo que a actividade escolar começa aos 6 anos, quando se chega aos 22 anos de idade totalizam-se 16 anos de escola, tempo suficiente para interiorizar as ideias-chave dos deveres do aluno e da lógica de funcionamento da instituição escola/universidade.

Encene-se mentalmente o episódio: o aluno prepara-se para o exame, chega à sala e é confrontado com um professor que frisa a idade e experiência dos alunos nestas andanças para que não seja preciso ficar alguém a fiscalizar as actividades na sala de exames. Após a saída do docente, a sala de exame virou palco de várias reacções: gente que se riu, gente que falou, gente que gesticulou mas também gente que procedeu exactamente como se procede no início de um exame, começando a ler o enunciado silenciosamente. A prova de carácter residiu na batalha entre a tentação e oportunismo de consultar os colegas ou apontamentos no sentido de responder às questões do exame, versus o respeito pelo código de conduta esperado num estudante digno e eticamente virtuoso. Muitos resistiram à cedência, mas acabaram por fraquejar devido à constatação do cedência plural do grupo, isto é, perderam o pudor devido à diluição da sua culpa no seio de uma maioria que sabia estar a desrespeitar as normas.

Houve quem não se apercebesse, por exemplo, que copiar é uma liberdade que lhe assiste, mas que daí a afirmar que o docente a isso levou, seja uma perversão da verdade. Houve também quem desconhecesse que corromper a conduta esperada é de facto uma liberdade individual, mas que se isso implicar ruído para os ouvidos dos que não o fizeram, talvez se esteja a mexer com os direitos ao silêncio dos outros.

Não esquecerei este exame: porque a matéria em causa até nem valia tanto para a avaliação final, o verdadeiro exame, se assim quiserem, foi de natureza moral, e nesse não chumbei.

4 comentários:

  1. Caro Marcelo Melo
    quando se está seguro da matéria, copiar é uma ofensa, uma afronta ao trabalho tido para a assimilar. Mas, se o ensino for sério, um momento há-de haver em que a esperteza sucumbe à obrigatória exigência de se mostrar o que se sabe. Se o ensino não for sério, os cábulas, grandes doutores do copianço, conseguem o seu canudo. Mas o maior canudo vão eles encontrar na vida prática, quando engenheiros formados, lhes for exigido que demonstrem o que sabem. E lá vai uma ponte abaixo, ou o tecto de uma estrutura que desabou.
    Não há nada mais triste do que uma pessoa enganar-se a si própria e não dar conta disso.
    Parabéns pelo desempenho.
    Com amizade.

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  2. Caro Marcelo.
    De facto, o verdadeiro exame revelou-se um exame de moralidade, mas esse infelizmente não conta para nota.
    Eu não encontro importância no copianço das outras pessoas, cada um faz o que bem entender, sabendo das consequências para o futuro. Quem copia agora, há-de copiar para toda a vida. Eu não gostaria de levar essa vida.
    Mas o mais importante neste tema é o desrespeito pelos outros, porque se havia alguém a querer manter-se correcto no exame, decerto viu isso ser-lhe dificultado, porque não lhe foi permitido estar concentrado.
    Ainda bem que alguns conseguiram manter-se dignos. Para mim, esses foram os que passaram no exame.
    Aquele abraço,
    Ivo Pais

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  3. Caro Poeta do Penedo,

    Aqueles que me conhecem do universo escolar sabem bem que sou avesso ao copianço, e que levo isto um bocado a peito.

    Mais, digo-lhe também que me escandaliza estudar numa instituição cuja fama e notoriedade a precede, e em que a trafulhice nos trabalhos/relatórios e nos exames estão tão presente e vincada.

    Nesta questão penso que estamos muito atrasados face a outros povos, falta-nos uma cultura do rigor.

    Veja bem, qual o sentido de se fazerem exames complicados quando só ao 2º aviso é que o estudante de facto é punido por copiar? Se isto não é uma cultura de falta de rigor, expliquem-me o que é...

    Um abraço,

    Marcelo Melo

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  4. Caro Ivo,

    A incapacidade que alguns têm de verificar que as suas atitudes podem interferir com os direitos dos outros, mostra bem porque motivo o ser humano dificilmente consegue viver sem conflitos ou sem guerras.

    Esta questão do copianço já foi por nós abordada por diversas vezes, sendo que o mais gritante é a forma como as pessoas vão tolerando a infracção porque acabam por estar envolvidas nessas actividades e como tal não estão em condições éticas de atirar a primeira pedra.

    Tolera-se isto e depois critica-se a corrupção no país? Enfim...

    Abraço,

    Marcelo Melo

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