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Sobre o livro Levantado do Chão, de José Saramago

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O livro Levantado do Chão, da autoria do incontornável José Saramago, remete para o Alentejo rural do período prérevolução dos cravos e relata a história de diferentes gerações de uma família de trabalhadores dessa região, os Mau-Tempo, ao mesmo tempo que caracteriza o viver e existir nessa região e altura.

Sobre a escrita escusam-se comentários, é José Saramago, com a sua imiscuição na história ora para dar ideia de que está a relatar in loco o que está sucedendo, ora para emitir opiniões ou mesmo ajudar o leitor a tirar conclusões sobre determinadas vicissitudes narradas.

Para além da experiência prazerosa da leitura, este livro proporciona uma oportunidade de compreender o comunismo que ainda hoje, volvidos tantos anos do fim da ditadura, é um traço típico do Alentejo, e fá-lo sem em momento algum se assumir explicitamente como um livro promotor dessa corrente política. Pelo contrário, o livro acaba por mostrar que o comunismo foi o modelo que melhor encaixava na existência débil e comum a todos os que faziam da agricultura por conta de outrem a sua forma de subsistência.

Numa outra vertente, o livro denuncia também o compadrio existente entre a guarda, os grandes latifundiários e a igreja, uma tríade repleta de corrupção e que garantia a não emancipação daqueles que, pertencendo ao povo, em melhores condições de visão e garra se encontravam para reivindicar melhores condições de vida. Os mais insurrectos eram manietados pela guarda, a qual funcionava a pedido e gosto dos grandes patrões, enquanto que o restante povo era mantido na estupidez e amordaçado silenciosamente ao seu destino por sermões religiosos repletos de intencionalidade.

Por último, Levantado do Chão retracta também o tempo em que a informação era por demais escassa, lenta e fluía quase exclusivamente pela dispersão do tipo boca-a-boca. As notícias geralmente eram trazidas por quem viajava, e em cima delas geravam-se muitas dúvidas, pois as palavras podiam ser escassas e a interpretação acidentalmente falseada.

Levantado do Chão é, sem sombra de dúvida, um excelente livro de literatura portuguesa. É-o não somente pela língua em que foi escrito, ou pela nacionalidade de quem o redigiu, mas sobretudo pela forma como transpira Portugal, pelo modo como, nunca esquecendo que se trata de uma ficção, consegue adquirir um patamar realista que confere ao leitor a noção de que a história narrada bem podia ter acontecido mesmo.

Quem lê Levantado do Chã sem preconceitos contra o escritor, a sua escrita, o Alentejo e o comunismo, arriscar-se-á a concluir a leitura e ficar ponderando porque motivos não mereceu este escritor mais honras, mais respeito e mais carinho pela comunidade lusa e pelas elites nacionais. É injusto.

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