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Sobre o livro 'As Terras Do Risco' (Agustina Bessa-Luís), e a diferença entre um fascínio pelo o que o outro é, e um fascínio pelo que isso nos permite a nós ser e vivenciar

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As Terras Do Risco, da amarantina Agustina Bessa-Luís, é um livro que requer fôlego, resiliência e tolerância para ser lido e apreciado. Versa sobre o casal francês Martin e Précieuse, que se estabelece na serra da Arrábida de modo prosseguir estudos académicos sobre a hipótese de William Shakeaspeare ter ascendência latino-judaica. O casal demora-se dois anos nestas paragens, tempo suficiente para se desenvolver uma trama com duas personagens locais, Piedade - que se torna amante e secretária de Martin - e Baltar - um misterioso guardião da serra e do convento onde se hospedam, hipnotizado pela beleza de Précieuse.

Agustina assina uma história relativamente extensa apesar de alicerçada num núcleo muito circunscrito de personagens, espaço, e ação, e em que a dimensão temporal está toldada. Promove uma narração que exacerba bagagem cultural, quer histórica como literária, criando com isso uma permanente aura de erudição ao longo da história, à qual se soma uma sobreexplicação da forma de ser das personagens, sobretudo de Précieuse, de onde emanam novelos de ideias expressas com assertividade mas de descodificação e vinculação duvidosa para o leitor.

É difícil extrair uma moralidade central desta história, desde logo porque não há certeza de que seja consumado um crime de amor no fim. As Terras Do Risco dá um contributo à valorização do património natural da serra de Arrábida, ao tabu académico da verdadeira identidade de William Shakeaspeare, mas é porventura ao nível da emancipação (ou não) da mulher e da multifacetada natureza da vinculação homem-mulher que o livro mais oferta de herança: da atração à libido, do compromisso matrimonial à extraconjugalidade, e ainda pela diferença entre o fascínio pelo o que o outro é, e o fascínio pelo que o outro nos permite ser e vivenciar por ser como é.

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