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Sobre a religião: o culto a deus

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O culto assumido a Deus constitui a mais direta forma de abraçar a religiosidade, sendo para mim um campo em que posso, como venho fazendo, explorar os motivos que presidem à minha admitida areligiosidade.

Os fiéis, ao longo da história, encontraram maneiras variadas de cultuar deus, bem como todas as demais personagens religiosas alvo de referência e louvor. Não contesto o sentimento de serviço e de beatitude com que o fizeram, nem o que pode fundamentar tal prática (medo, gratidão, etc), mas dou comigo, hoje, a perguntar-me, porque continuamos a prestar culto a deus. Julgo que esta ideia do culto está presa por arames ao conceito de um deus humano que tantos têm para consigo. Por muito esforço despendido, só um deus caracteristicamente humano pode perceber o valor da materialidade, o sentido de sacrificar uma vida, ou dar uma esmola. Hoje em dia, acho inclusivamente que se presta mais tributo a santos e beatos do que a deus, gente, em suma, que se subiu na hierarquia religiosa foi por força de outros homens, mais do que por ingerência divina.

Porque quereria deus um culto? De que forma sacrificar um animal pode agradar a deus, se estamos no fundo a destruir o que ele criou? Porque terá deus a necessidade de culto? Terá ambição de poder, como nós? Não poderá deus ser uma mera força, a derradeira Força ou Energia, para lá da consciência humana, alheia sentimentalmente ao que produziu ou tornou consequência? Como poderemos prestar culto ao que desconhecemos quando nem sequer podemos tornar claro a lógica (as vias, os mecanismos) desse culto? Porque não celebrar a vida, ao invés, louvando-a pelo maravilhoso bem que é?

No fundo, por que não ver na naturalidade das coisas a melhor forma de cultuar deus? Não será o livre arbítrio uma forma pródiga de beleza e oportunismo para prestar culto à liberdade de todos e do universo natural em que vivemos, como produto desse deus? De que forma questionar a existência de deus, não será, também, um culto válido, honrado e amoroso?

1 comentário:

  1. Olá Marcelo,

    O teu texto é um belíssimo convite a reflectir sobre este tema que muitas vezes divide as pessoas, sem as levar a conclusões esclarecedoras. Apontas vários pontos muito bons. Revejo-me na tua atitude e não a etiquetando de "areligiosidade", cito as palavras de Blavatsky: "Não há religião superior à Verdade." Esta deveria ser a demanda de toda a humanidade: a procura da verdade, esteja ela onde estiver, agrade ou não aos pensamentos cristalizados nas mentes (própria e alheias), por vezes estreitas, de cada homem.
    Apenas me distingo num ponto de ti: eu compreendo o porquê de um culto a deus, e digo mesmo que para certas pessoas tal será mesmo necessário, assim como para outras é totalmente desnecessário nas formas mais usuais da religião. Isto porque nem toda a gente tem a mesma capacidade para entender certas verdades e portanto há que adaptar a verdade a cada um. Há níveis de entendimento e como tal devem haver níveis distintos de transmissão das verdades que se podem entender. Nesse aspecto, acho que a religião tem uma missão. Por outro lado, nem sempre a religião desempenhou bem esse papel, e em muitos casos desempenhou-o mesmo muito mal. Esse é o problema que conota pobremente a religião. A religião que desempenha bem o seu papel deve levar o homem a intuir algo superior a si próprio e a dedicar-se a esse algo, no sentido do seu próprio desenvolvimento como ser humano, das suas potencialidades e virtudes - é um primeiro passo para viver e entender posteriormente as coisas num sentido mais complexo; e para além disso deve proporcionar um caminho que não trava as pessoas que, chegando aos limites do que a religião pode proporcionar, necessitam de saber e viver mais verdades. Deveria servir de ponte para um patamar mais interno da compreensão da vida, do homem, de deus, de tudo o que existe. Relaciono esse patamar seguinte com a Filosofia (o amor à Sabedoria), havendo ainda outro no seguimento deste, o caminho que leva o Discípulo às várias iniciações, ou contactos directos com a verdade.
    Tudo honra a Deus, pois se tudo procede dele e tudo retornará a ele, que poderá existir que lhe cause dano ou qualquer reacção mais própria de um humano e menos de um legítimo deus? Tendemos a dar atributos de humano à divindade, e esse é um dos erros de quem quer viver a religiosidade, a meu ver.

    Beijnho,

    Stelya Pereira

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